07 julho 2011

As glórias da Escócia



Quando eu cheguei em Edimburgo, sabia que podia encontrar alguma referência a Walter Scott, tido como o "pai" do romance histórico. Um livro muito popular, "Ivanhoé", foi escrito por ele no começo do século XIX. Também se deve a Scott e a esse livro a popularização do nome e da figura de Robin Hood.

Caminhando pelo centro da cidade, eu vi uma imensa construção, que de longe me pareceu um obelisco e, mais perto, um mausoléu, mas não pude ver a quem era dedicada. No centro velho da capital da Escócia, logo deparei com a estátua de Adam Smith. A poucos metros dali, foi a vez de David Hume. Imediatamente me lembrei das aulas de filosofia e do meu amigo Renato Maia, leitor de Hume. A estátua de Scott deveria estar próxima. Os escoceses são um povo desenvolvido e sofisticado, e logo percebi que muito disso se deve a uma depurada noção da História. Não se trata de fazer homenagens com estátuas em praças públicas. O caso é o de se orgulhar de seus homens. As estátuas vêm depois, em consequência.

Claro que muito do progresso do Reino Unido nós sabemos a que se deve. O Castelo de Edimburgo tem várias seções dedicadas às guerras, desde tempos remotos em que os escoceses tinham de se defender dos vizinhos conquistadores do sul até o momento em que se juntaram a eles formando as poderosas armas britânicas.

O pequeno contato que tive com escoseses me permitiu ver um povo educado e amigável, não tão reservado quanto o inglês. Mas esses, por enquanto só os conheço de observá-los no Tube londrino. Depois do lago Ness, fomos para Inverness, considerada a capital das "highlands of Scotland". Foi o lugar mais perto que eu cheguei do polo até agora. Lamentei que tivéssemos apenas uma noite na cidade. Por isso eu não quis ir pra cama tão cedo. Foi o melhor que eu fiz. Onze horas, meia-noite e as trevas não chegavam. Numa passarela sobre o rio Inverness eu vi o horizonte. Lindo. Ao sul a noite total e ao norte um céu azul claro e escuro riscado como o dorso do tigre. Ainda conheci uns highlanders saindo de um pub com suas vestimentas características. Conversamos sobre alguns costumes escoceses, conversamos sobre aquela noite que me pareceu mágica. Eles não se conformaram quando eu disse que seria a única.

Na manhã seguinte, de volta a Edimburgo, fui até aquele obelisco e lá estava. Nunca vi tamanha glória dedicada a um escritor. O "Scott Monument" parece querer tocar o céu que ali na Escócia parece tão próximo.


02 julho 2011

O mito de Rogério Ceni


Nesta semana tive uma noção do mito de Rogério Ceni. Não que eu não tivesse. Rogério, com suas falhas e tudo o mais, é há muito tempo um dos grandes. Se fosse escocês, teria uma estátua numa rua de Edimburgo, mas isso é uma outra história. 

As coisas não foram fáceis para os são-paulinos. Primeiro veio a goleada de domingo. Depois, a perda da liderança do campeonato no Morumbi. Ambos os jogos tiveram falhas de Rogério Ceni. Como são-paulino e admirador de Ceni, eu apenas pergunto: e daí? E não penso no lugar que ele ocupa na história do São Paulo, mas em tudo o que ele tem feito em temporadas recentes. Minha memória não acaba na primeira falha nem na segunda. Para os adversários, claro, os frangos são um prato cheio. Normal, todos sabem quem é Rogério Ceni. Talvez eles saibam ainda melhor do que nós. Vê-lo falhando deve ser irresistível. Rogério deve estar abalado, mas deveria estar feliz também. Porque algumas brincadeiras, ao mesmo tempo em que transpiram dor-de-cotovelo e rancor, dão a dimensão de sua grandeza.

O goleiro-artilheiro tem quase mil jogos, cento e um gol marcados e pelo menos cinco títulos importantes. Aí falha uma, duas vezes seguidas (como, aliás, já falhou muitas outras vezes) e uma turba enloquecida corre em desespero para ver quem tem a tirada mais engraçada. E também essa corrida tem lá a sua graça.

Mas o melhor para mim veio na segunda, logo depois da goleada no clássico. Apareceu um professor substituto por aqui. Londrino, mas de família liverpodliana, ele me explica ao justificar ser torcedor do Liverpool. Do Liverpool e do São Paulo, ele logo acrescenta, sem ainda saber que sou são-paulino. Tento entender. Ele me diz que isso vem de criança, e que sempre admirou um cara que ele considera extremamente injustiçado: Rogério Ceni. "Como ele pode ser apenas o terceiro goleiro da seleção brasileira?", ele me pergunta, e eu respondo que hoje ele já não é. O professor não se conforma, mas a revelação me traz uma alegria que nem todos compreenderão. Os são-paulinos, sim.

'Pilatos', de Carlos Heitor Cony, simboliza o Brasil de Delfim Netto

Pilatos , romance de Carlos Heitor Cony publicado em 1974, pode ser lido como um retrato do Brasil de Delfim Netto, um dos artífices da dita...