Uma vez, numa véspera de Natal, a família estava pronta para a ceia quando um amigo do meu pai apareceu lá em casa completamente bêbado. Buscava o perdão por algo estúpido que fizera. Sempre quando chega o Natal eu imagino a solidão daquele homem naquela noite. E de outros como ele.
Imagino como ele começou a pensar na vida que levava, uma vida bem sucedida aos olhos de qualquer um, como começou a notar as coisas que perdera e se pôs a beber enquanto relembrava o amigo com quem se desentendera durante uma de suas bebedeiras. Em algum momento, encorajado, deve ter percebido que aquele era o momento propício para o perdão, afinal, era a véspera do dia em que Ele nasceu. Claro que, chegando como chegou, embriagado como estava, acabou se atrapalhando e o pedido tão sincero nos pareceu a todos um reflexo da embriaguez. Algum tempo depois, os amigos se reaproximaram e a vida seguiu como deve seguir.
Essa é uma das memórias mais marcantes que tenho da noite de Natal, mas não creio que por isso me tornei um daqueles tipos que sempre acharam o Natal melancólico, triste. Ao contrário, creio que fixei essa lembrança justamente porque tenho essa predisposição. Apesar de todas as declarações sinceras de “Feliz Natal”, os natais sempre me pareceram uma falta, uma desesperança, mesmo com todo o carinho da família e dos amigos. Houve natais diferentes, uma alegria que eu nunca consegui sentir de verdade. Havia presentes, havia a comida e era sempre tanta comida para tão pouca gente, mas o fato para mim é que os natais, de algum modo, são a solidão daquele amigo do meu pai. Os natais para mim sempre foram um pedido de perdão e um desejo grande de poder ser perdoado.
Passar o Natal tão longe não vai ajudar a dissipar essa sensação. O frio que sinto pela primeira vez é real, o inverno que acabou de chegar só aumenta a vontade de estar por perto, aquecido, mas sei que se estivesse com os meus estaria sentindo exatamente a mesma coisa e talvez tentando disfarçar, como se não devesse estar ali, como se não pertencesse àquilo tudo.
Apesar de ir a missas na minha infância e na adolescência, eu nunca fui à missa na noite de Natal, pelo menos não me lembro de ter ido, mas gostava de ver as transmissões da “Missa do Galo”. Gosto até hoje. É um dos momentos reconfortantes, quando eu me sento e vejo aquele ritual tão antigo quanto a própria história do Natal. Algo que atravessou tantos séculos, que animou tantas vidas e que se mantém.
Sinto falta desses momentos, sinto falta de tudo e de todos. Sinto falta da segurança de poder voltar para casa. De algum modo sempre quero voltar para casa, e agora que a volta não está tão distante quanto parecia estar há alguns meses, sinto como nunca o tamanho e o peso da distância. Como uma tristeza viva, latente, aumentada pela força da data em que temos que estar, ou pelo menos parecer estar, felizes.
Os pequenos gestos e as pequenas coisas, como o terço que há pouco eu encontrei num bolso interno que eu nunca tinha suspeitado existir na minha mala, um terço que, como tantas outras coisas, foi colocado ali pela minha mãe, essas coisas me dão a coragem necessária para atravessar esta noite.
E é durante essa travessia que eu quero dizer aos meus amigos, a todos eles, o quanto sinto suas faltas e o quanto eu lhes desejo um feliz Natal. Eu poderia fazer isso de outro modo, há tantas maneiras mais rápidas e fáceis, mas sei que eles entenderão que este é o meu jeito mais puro de lhes desejar uma noite feliz. Se, num relance, virem a Missa do Galo, lembrem-se que se eu estivesse por aí, gostaria de estar assistindo.
Ô Vi, para de chororô rapaz!!!
ResponderExcluirVolta logo pra gente fazer um churrascão e você contar as coisas pelas quais passou e aprendeu. Abração. Acompanho seu blog, mas você está muito preguçoso. Precisa atualizá-lo com mais frequência rsrsrs.
Maurício.